Carta de mãe para filho

Mê querido filho,





Ponho-te estas poucas linhas para saberes que estou viva.


Escrevo devagar por que sei que não gostas de ler depressa. Se receberes esta carta, é porque chegou. Se ela não chegar, avisa-me que eu mando-te outra.


Bom, não vais mais reconhecer a casa quando vieres, porque a gente mudou.


Finalmente enterramos o avô. Encontramos o cadáver durante as mudanças. Estava no armário desde aquele dia que nos ganhou no jogo das escondidas.


No outro dia, houve uma explosão na botija de gás aqui na cozinha. O pai e eu fomos atirados pelo ar e caímos fora de casa. Que emoção: foi a primeira vez em muitos anos que tê pai e eu saímos juntos.


Na semana passada, o médico veio visitar-me e colocou na minha boca um tubo de vidro. Disse para ficar com ele por duas horas sem falar. O teu pai ofereceu-se para comprar o tubo.


A tua irmã Maria vai ser mãe, mas ainda não sabemos se é menino ou menina, portanto não sei se vais ser tio ou tia. O teu irmão António é que me deu muito trabalho hoje. Fechou o carro e deixou as chaves lá dentro. Tive que ir a casa, pegar a suplente para o abrir. Por sorte, cheguei antes de começar a chuva, pois a capota estava em baixo.


Sobre o casaco que querias, o tê tio disse que seria muito caro mandar-to pelo correio por causa dos botões de ferro que pesam muito. Assim, arranquei os botões e puse-os no bolso. Quando chegar aí, prega-os de novo.


Sobre o nosso cão, o Joli, anteontem foi atropelado e tiveram de lhe cortar o rabo, por isso toma cuidado quando atravessares a rua. E na 2ª feira teve tanto vento que uma das galinhas pôs o mesmo ovo 3 vezes.


Ah! Se vires a Dona Esmeralda, diz-lhe que mando lembranças. Se não a vires, não digas nada.






Tua Mãe






P.S. Ia-te mandar cem escudos, mas já fechei o envelope.